DE SÃO ROQUE, PELA JUNQUEIRA
ATÉ AO CHINÊS
- 1 -
“Toque, toque, toque.
Vamos a São Roque
Ver os pastorinhos
Que vem de capote!”
Não ! Não ! Hoje viemos a São Roque, para recordar as gentes, o comércio que viveram entre os finais dos anos 20 e até 1940. Todo este passeio se propõe dar àqueles que quiserem ter a maçada de nos acompanhar, diremos que o antigo Largo de São Roque, é a nossa bem conhecida Praça da República.
Vindo da Praça do Almada, pela rua Silveira Campos, depare-se-nos logo à entrada do largo, no gaveto formado com a velha rua da Lavadeiras, o lugar do antigo estabelecimento de Joaquim Martins da Costa (o Quim do Cano), depois dos anos de trinta ocupado pela casa Galante, uma casa de comes e bebes, muito frequentada, dizem, pela excelência dos seus vinhos (também por lá andei).
No andar cimeiro desta casa esteve durante vários anos a Secretaria Notarial e, como local mui frequentado por aqueles que necessitavam de fazer escrituras, doações, testamentos e outros serviços, era ponto ideal para se afogarem as desilusões, se as havia, ou festejar, se o negócio lhes corria de feição.
Era um locanda onde por vezes se reuniam uns pândegos e diz-se até que dois deles, amantes da boa pinga, disputaram certa vez sobre o que provocaria a maior sede. Um apresentou um caroço de azeitona, mas o outro achava que para beber uma canada de bom verdasco, bastaria desenhar a azeitona num pedaço de papel.
Seguindo por este lado nascente do largo, encontrava-se a loja de fazendas, cujo proprietário era (creio que) o snr. Ferreira (Patrazana), pai do meu falecido amigo António Augusto. Este estabelecimento confrontava, paredes-meias, com a mercearia do Luizinho do Armazém que fazia ângulo com a rua Cidade do Porto.
Fronteiro a este, e a norte, encontrava-se a casa “Frasco & Irmão”, onde se vendia, desde fazendas a papelaria e onde havia também uma secção de tipografia onde se compunha e imprimia o nosso “Comércio”. Mais tarde, por volta dos anos trinta, a velha Reigoiça fazia mover, braçalmente, a Marinoni, onde era impresso o então jóvem jornal hoje centenário. A Reigoiça era sogra do tipógrafo-poeta e meu falecido amigo Joaquim Pereira da Silva.
Na nossa rota vamos encontrar a casa oculista do Mendonça, casa que ainda hoje existe. Já quase na entrada da Junqueira, lá estava ( e ainda estará ?), a barbearia do Costa onde, por avença mensal, se cortava a barba e o cabelo.
Agora, e ainda no Largo (Praça da República), encontramos duas construções que tem resistido ao camartelo do progresso. Um, resistirá para sempre – o templo de São Tiago, ou de São Roque, como era conhecido. O outro, que esperamos seja por muitos mais anos, e está à ilharga do templo, é o edifício-sede do velhinho “Clube Naval Povoense”, mesmo à entrada rua da Ponte.
No gaveto formado pela entrada da hoje rua João Dias, um stand de biciclos, cujo proprietário era o Mário das Bicicletas, que as alugava à rapaziada, por quartos, meias ou horas. De fronte, no gaveto, a Casa de montagens eléctricas e rádio, Correia – foi talvez a primeira firma a vender aparelhos de T.S.F. sendo representante na Póvoa da “Telefunken”. Junto a esta, o estabelecimento “Rios & Irmãos”, que subsiste talvez com outra denominação.
Já nos finais dos anos quarenta, o saudoso amigo Dr. Jorge Barbosa, tinha logo a seguir o seu consultório médico. Uma ou duas casas adiante, cabia a vez de outro estabelecimento de pichelaria e funilaria. O seu proprietário, Gomes, ficou conhecido pela alcunha de o faquinhas. Cabe aqui dizer como é que a alcunha apareceu.
Até por volta do meado do século vinte o transporte, como sabemos entre a Póvoa e Vila do Conde, efectuava-se por meio dos carros americanos – os famosos mulectricos. O trajecto na Póvoa, vindo da rua Almirante Reis, passava pela Praça do Almada, rua Silveira Campos, e seguia pela Junqueira (nos primeiros anos de vinte), em direcção à Meia Laranja, na praia (princípio do Passeio Alegre). Sendo assim penetrava no Largo de São Roque. Ora, o Gomes, nesses recuados anos era um rapazinho, e por certo traquinas e inventor de brincadeiras.
Os carros americanos, puxados por muares, seguiam por carris de ferro. Logo o miúdo resolveu colocar nos carris, uns pregos, que sobre o peso dos carros, eram laminados e transformados numa pequena faca e daí lhe veio o apelido que o acompanhou toda a vida e perdurou até nos seus descendentes.
Por hoje chega de passeio. Logo que seja possível e o espaço do Comércio o permita, continuaremos pela Junqueira fora e até ao Chinês.
Braga, 6 de Agosto de 2008
LUÍS COSTA